Rafael Nacif | Outubro 2023

Em “Making sex – body and gender from the greeks to Freud”, Thomas Laqueur faz uma historiografia da visão sobre o sexo da civilização grega até Freud. No livro, o autor mostra que a vagina era inicialmente vista como um pênis interiorizado. Os sexos são diferentes, assim como corpo e alma. A diferença dos sexos, no sec. XVIII, está na natureza dos corpos. No pré-Iluminismo, havia uma simples separação entre os gêneros. No séc. XVIII, os sexos eram uma questão sociológica e não categorias ontológicas. Para os cientistas da época, os homens gastam energia e as mulheres conservam energia. A ovulação é uma marca na diferença entre os gêneros. A mulher gera filhos, o homem não. No feto, os órgãos genitais possuem a mesma origem. Até 1759, a estrutura humana estudada pela Biologia era a masculina. A sociedade assombra a sexualidade humana. O livro não é sobre a descoberta do gênero, mas do sexo. O sexo é explicado nas disputas políticas de gênero e poder. As identidades masculina e feminina são construções sociais e culturais. A divisão de gêneros masculino e feminino são produto da heterossexualidade. A sexualidade é uma espécie de obra de arte. O sexo é contextual. Textos geram diferenças sexuais. O autor reconhece a misoginia na produção científica. O corpo feminino é visto como uma versão do corpo masculino. Os sexos são divididos por uma mesma anatomia. O útero e a vagina são formas não desenvolvidas do pênis e do saco escrotal. Para Aristóteles, o sexo existe para a reprodução da espécie. A fêmea distingue-se do macho, para o filósofo, porque ela gera filhos e homem possui o material para gerar filhos. Nesta época, o homem caça, a mulher procria. Os gregos viam os homens como mais quentes que as mulheres. Na Grécia Antiga, acreditava-se que se um homem produzia esperma fraco gerava uma filha, e se produzisse esperma forte, gerava um homem. Neste período histórico, o homem é mais perfeito que a mulher pelo excesso de calor. A libido não tinha sexo. Machos lançam esperma, fêmeas sentem orgasmo. Não era anti-natural homens maduros se sentirem atraídos por rapazes jovens. Mesmo assim, o desejo pelo mesmo sexo era visto como pervertido, doentio nojento. Escravos não faziam sexo. Trabalho físico era sinal de inferioridade. A mulher é vista como inferior ao homem. O homem é necessário à concepção. Historicamente, diferenças de gênero precederam diferenças de sexo. O corpo canônico da Antiguidade é o corpo masculino. Columbus descobre o clitóris em 1559. Os médicos da Renascença acreditavam na existência de apenas um sexo. Homens eram considerados superiores às mulheres. Ser homem é se tornar pai. No séc. XIX, a questão do sexo é biológica. Marie de Marcis quase foi queimada por lesbianismo. Em 1459, queimava-se aquele que desempenhasse papel diferente de seu gênero. A mulher que se passasse por homem era enforcada. O sexo determinava o gênero. Sexo era uma questão sociológica e não ontológica. No séc. XVIII, o sexo foi inventado. Houve a divisão do macho e da fêmea. Inventou-se dois sexos, refundando o gênero. O sexo biológico ganha destaque. Neste período, o sexo substituiu o gênero. A mulher não é mais inferior ao homem. A diferença entre os sexos destaca o papel do sexo. Os homens fazem o contrato social. No fim do séc. XVIII, onde antes havia um sexo, agora existiam dois. A mulher não deve conceber sem consentimento. O corpo masculino ainda é referência. O corpo feminino é mostrado no que difere do masculino. Nos séculos XVIII e XIX, revoluções políticas fundamentaram a divisão dos dois sexos. No casamento, quem manda é o homem. A Revolução Francesa gerou novas ideias de igualdade entre homem e mulher. O homem deveria ser ativo e forte e a mulher passiva e fraca. A mulher é associada a mente e o homem à natureza. A masturbação leva ao adoecimento. Freud inventa o orgasmo vaginal. Como vimos em Thomas Laqueur, houve um trajeto longo entre a criação do sexo, que só aconteceu no século XVIII. Antes disso, a mulher era vista como inferior ao homem. A ciência sexual era misógina. O corpo feminino era simplesmente visto como uma inversão do corpo masculino anatomicamente falando. Foram necessárias muitas descobertas científicas e o acesso aos corpos para estudos anatômicos e o desenvolvimento de técnicas científicas específicas, que, ao lado da evolução social, homens e mulheres fossem vistos como seres iguais de gêneros diferentes. Em “A invenção da pornografia”, Lynn Hunt atesta que a pornografia não se constituía como gênero até início do séc. XIX. Emerge, a partir do Renascimento, da Revolução Científica, do Iluminismo e da Revolução Francesa o gênero pornográfico. A pornografia é uma resposta à ameaça de democratização da cultura. Os livros pornográficos deveriam ser condenados por transgredirem a ordem social. Há uma relação entre pornografia e democracia. O principal pornógrafo que ajudou neste processo foi Pietro Aretino. A pornografia era vista então como uma representação realista, escrita ou visual, de órgãos genitais ou condutas sexuais, que implicam transgressão deliberada da moral e dos tabus sociais existentes e amplamente aceitos. O desenvolvimento da pornografia está vinculado ao desenvolvimento do romance. O Iluminismo sexual foi uma parte do Iluminismo. O Marquês de Sade defendia a aniquilação do corpo em nome do desejo. A pornografia vinculou-se à subversão política e religiosa. Definir a pornografia é definir as interseções entre sexualidade, política e saber. A pornografia era uma nova literatura para um novo tempo. A sodomia é apresentada como expressão natural da nobreza e do saber. A vitória política era uma forma de conquista sexual. Os homossexuais eram marcados com ferro quente. L’Ecole des filles inaugurou o gênero pornográfico. A pornografia é um gênero francês. Ela criou uma nova epistême. A pornografia se relaciona com o surgimento do romance, especificamente o romance epistolar. O sexo era uma analogia perfeita para a tirania. A pornografia desafiava a hierarquia tradicional. Conforme vimos, em ambos os livros, pode-se notar o gradual desenvolvimento de uma política de gêneros vinculada ao sexo, que só foi inventada no séc. XVIII. Os avanços científicos permitiram elevar o lugar da mulher no contexto sexual e diminuir a misoginia que a própria ciência desenvolvia em seus estudos e tratados, inspirada por contextos em que o corpo masculino era visto como referência para o corpo feminino. Na Antiguidade, a mulher era diferenciada do homem por gradações de calor corporal e o corpo feminino era visto como uma inversão do corpo masculino. Com o avanço científico, no lugar de apenas um sexo, identificou-se dois sexos autônomos, com funções naturais distintas e complementares. Mais recentemente, nos anos 60, com a invenção da pílula anticoncepcional e a ascensão das identidades culturais minoritárias causada pelo movimento contracultural, a homossexualidade não é mais tratada como inferior à heterossexualidade, os corpos de homens e mulheres ganham mais autonomia e a política de gêneros sexuais vai ser revolucionada pelos avanços científicos que permitem a prática do sexo por prazer independente da função reprodutiva que durante anos aprisionou homens e mulheres em campos opostos da ciência sexual. A pornografia, a partir do séc. XVIII, ganha espaço, junto com o desenvolvimento do romance e, homens e mulheres podem se satisfazer solitariamente ou em conjunto depois da revolução contracultural do período pós-segunda guerra mundial.

Resenha sobre “MAKING SEX – BODY AND GENDER FROM THE GREEKS TO FREUD” de Thomas Laqueur e “A INVENÇÃO DA PORNOGRAFIA” de Lynn Hunt