Alexandre Marques | Junho 2022

Assim como é destacado por Milton Santos em seu livro “Pobreza Urbana”, o teórico inglês Iain Buchanan acentua sobre a definição de pobreza: “O termo pobreza não só implica um estado de privação material como também um modo de vida – e um conjunto complexo e duradouro de relações e instituições sociais, econômicas, culturais e políticas criadas para encontrar segurança dentro de uma situação insegura”. As questões trazidas pelo teórico certamente se tornam atenuantes para que haja a distinção de fatores sobre a desigualdade que, consequentemente, poderão designar a sociedade entre aqueles que estão no centro e os marginalizados pela mesma.

“relações e instituições sociais, econômicas, culturais e políticas criadas…”, vale destacar nesse trecho da citação do autor que os critérios adotados para expressar o estado de pobreza estão totalmente ligados a situações impostas a sociedade. Isto é, ações e situações que pouco dependem da ação do cidadão por si só, mas sim de ações governamentais, públicas e privadas – sendo todas essas influenciadas pela reação geral da sociedade. Sendo assim, são os fatores que criam esse estado de pobreza, determinante para expor a desigualdade social, que irão marginalizar parte da sociedade, de modo que a desigualdade social presente na mesma evidenciará como uma parcela está destinada usufruir de recursos precários, enquanto outra poderá usufruir de recursos mais sofisticados.

Portanto, temos em evidência a questão da marginalização como um resultado daquilo que a sociedade construiu, ou melhor, construiu em parte para alguns e faltou para com outros. Fato é que não podemos considerar que a marginalização seja um resultado aceitável mediante a um planejamento de urbanização e cidadania justa e igualitária. Como define o demógrafo Philip Hauser, e novamente o autor Milton Santos destaca como citação em seu livro, “Se os ritmos elevadas de urbanização persistirem nas regiões subdesenvolvidas, terão por efeito agravar ao invés de suavizar a pobreza e a miséria atuais das cidades”. 

Contudo, o entendimento sobre o que é marginal é totalmente deturpado. Tomemos como exemplo a situação das favelas, certamente os moradores dessas localidades são pessoas marginalizadas por terem um serviço social escasso de saneamento, saúde pública, cultura, educação, mobilidade urbana e segurança pública. Porém, em entendimento do senso comum, a definição de marginal para moradores das favelas será como uma designação daquele que é contra as leis vigentes e propagador da desordem. E esse entendimento banalizado tem suas parcelas culposas separadas principalmente entre governos, mídias e sociedade.

Se tomarmos o programa “Brasil Urgente” apresentado por José Luis Datena ou então o programa “Cidade Alerta” apresentado costumeiramente por Luiz Bacci como exemplos, veremos como o ritmo policial dita e pauta todo o desenrolar das reportagens, de modo que a figura do policial e do combate ao crime venha ser quase que endeusada – comum de programas sensacionalistas no Brasil. A grande questão neste caso é que programas desse tipo são antiéticos com a prática jornalística de apuração e divulgação de informações, já que grande maioria das coberturas “jornalísticas” feitas pelos mesmos procura somente apontar aqueles que são culpados e inimigos da sociedade, e por uma questão que só acentua a segregação social, essas coberturas policiais são feitas somente em áreas pobres e, às vezes, miseráveis. E é aí que está o lugar perfeito para se apontar para alguém como marginal.

Ainda que pareça tolo, o modo como o termo marginal foi adotado para ditar definições impostas pela mídia sobre a sociedade é totalmente impactante para que a sociedade não enxergue o grande “x” da questão que apresente a segregação social em forma de recursos prestados a poucos e não prestados a muitos. Cabe ainda a crítica as políticas públicas governamentais – as que tangem questões educacionais, em especial – que pouco caso fazem para instruir aspectos que evidenciem como dever ser interpretado verdadeiramente a marginalização. Aliás, talvez não haja essa ação por parte do governo, pois é interesse do mesmo que a sociedade continue “cega” para que não reaja mediante suas desigualdades. 

A prática de marginalizar camadas das sociedades por suas diferenças sempre foi estratégia de direções políticas para que seus “poderes” possam ser ainda mais estabelecidos. Não foi diferente na Alemanha nazista, na Itália Fascista e em diversos outros governos (pequenos ou grandes) que manipularam ou até mesmo dizimaram seus cidadãos por apontarem suas camadas sociais de forma desdenhosa. 

Fato é que o termo “marginal” ganhou dosagem e teor pejorativo para a população brasileira. Tornou-se vergonhoso e depreciativo ser chamado de marginal, quando na verdade é vergonhoso que exista que marginalize. A questão da marginalidade não tange sequer a questão de lugar, visto que o centro geográfico de uma região não será o centro social dessa mesma região. Tratar de marginalidade é tratar de pessoas que são alocadas em qualquer lugar que seja para que ali elas estejam juntas para serem depreciadas e passar longe da devida assistência social que o Estado deveria dar. 

Não podemos aceitar que uma parcela da sociedade não tenha o acesso pleno à saúde pública, não tenha uma educação de excelência, nenhum acesso à cultura e que seja totalmente desprotegida pela segurança pública que, pelo contrário, ataca-a com o respaldo do preconceito étnico-social. O marginal não é o culpado, mas sim a vítima. E desbanalizar o termo, para que haja a consciência da sociedade sobre sua devida situação, é o primeiro passo para que haja a mudança necessária contra a marginalização. 

.   .   .

Alexandre Marques é estudante de Jornalismo na Unicarioca.

Contato: alexandre.lima_7@hotmail.com |@al3xandremarques (Instagram)

A desqualificação do termo marginal