Eduardo Ribeiro e Beatriz Araújo | Julho 2021

O presente texto tem como objetivo analisar o fenômeno sul-coreano BTS, a partir da teoria da convergência de Henry Jenkins. Iremos demonstrar como esse grupo de k-pop se tornou um produto midiático, apresentando os produtos feitos a partir do grupo BTS e também a atuação de seu fandom, denominado “Armys”, nas redes sociais.

Bangtan Boys, mais conhecido como BTS é um boy group de k-pop sul-coreano composto por sete integrantes, sendo eles: RM, Jin, Jimin, J-hope, V, Suga e Jeon JungKook. O grupo foi criado pela antiga Big Hit Entertainment, agora chamada Hybe Corporation. Após alguns anos atuando como trainers, eles debutaram no ano de 2013 com o single “No More Dream” juntamente com o videoclipe, vendendo cerca de 50 mil cópias. Assim, iniciaram sua carreira e logo conquistaram muitos fãs.

O BTS se tornou uma potência muito grande, tanto nas redes sociais quanto fora delas. Os meninos estão constantemente quebrando recordes por conta de seu fandom tão empenhado. Um exemplo disso, é a música denominada “Dynamite”, lançada em agosto de 2020, que quebrou vários recordes e entrou para o Guinness Book na categoria de mais visualizações simultâneas em um vídeo musical no YouTube, logo em sua estreia. Além de outros recordes, como:

  • vídeo mais visto em 24 horas no YouTube;
  • vídeo musical mais visto em 24 horas no YouTube;
  • e também vídeo musical de um grupo de K-pop mais visto em 24 horas no YouTube.

Outro feito é que após uma série de hashtags no twitter feita pelos seus fãs, autointitulados “Armys”, o videoclipe ultrapassou a marca de 1 bilhão de visualizações no YouTube.

Atualmente, o grupo possui parceria com quatro das dez marcas mais consumidas no mundo, segundo a Forbes. Sendo elas: em sexto lugar a Coca-Cola, em oitavo a Samsung, em nono a Louis Vuitton e em décimo o McDonald’s. Um fato interessante de comentar é que essas marcas tiveram que fechar contrato com todos os membros do grupo (diferente do que ocorre com outros grupos do k-pop, no qual só um ou dois membros são escolhidos), por conta de uma política deles.

A marca deveria contratar os sete, o grupo inteiro, ou nenhum deles. Foi através dessa política que recentemente fecharam uma parceria com a Louis Vuitton, tornando-se embaixadores globais da marca. Eles também lançaram uma coleção em parceria com a marca esportiva Fila, e outras grandes marcas conhecidas mundialmente, como a Puma, LG, Mattel e VT Cosmetics. Eles também se destacam por usar sua influência em questões humanitárias, inclusive o grupo fez parcerias com a UNICEF e Starbucks para ajudar na divulgação de causas.

Ademais, outro fator que comprova o fenômeno do grupo é que tudo que eles tocam/vestem “vira ouro” como é o caso do colete Monogram Boyhood da marca Louis Vuitton, utilizada pelo integrante J-Hope durante uma sessão de fotos. Rapidamente, após uma prévia ser divulgada no twitter, os fãs foram atrás para adquirir a peça avaliada em cerca de 40 mil reais, que logo se esgotou. Mais um exemplo, é a de uma camisa usada pelo membro Jimin durante um comercial para a marca Hyundai. Ele utilizava uma camisa xadrez da grife R13, avaliada em cerca de 3 mil reais, também foi muito procurada pelos fãs, que chegaram a acabar com o estoque.

Outro caso foi quando o membro Jungkook fez uma live através da plataforma V-Live e, durante a transmissão, tomou um chá. Ao comentar um pouco sobre a marca, e a importância de ajudar comércios pequenos/locais, ela obteve cerca de 500% de aumento nas vendas na semana seguinte. Isso se deve ao fato de como a participação das pessoas é essencial quando pensamos na transformação cultural.

Os fãs acabam sendo os principais atores entre os consumidores e profissionais de marketing pois são dedicados e envolvidos em tudo que os seus ídolos promovem ou utilizam. “O marketing num mundo interativo é um processo cooperativo, em que o profissional de marketing ajuda o consumidor a comprar, e o consumidor ajuda o profissional de marketing a vender” (HAGEL; ARMSTRONG apud JENKINS, 2006, p. 108).

Segundo Jenkins (2006), essa cultura de convergência não está tão interessada na forma como a tecnologia condicionou essa midiatização, mas sim nessa nova forma de organização de consumo e produção de conteúdo. Na forma como consumimos essa nova cultura, de como passamos de apenas receptores passivos, para o lugar de protagonismo do público, na participação ativa.

“A convergência das mídias é mais do que apenas uma mudança tecnológica. A convergência altera a relação entre tecnologias existentes, indústrias, mercados, gêneros e públicos. A convergência altera a lógica pela qual a indústria midiática opera e pela qual os consumidores processam a notícia e o entretenimento” (JENKINS, 2006, p. 43).

Um fato interessante desse fenômeno sul-coreano, é que os integrantes do BTS não possuem contas individuais nas redes sociais (em nenhuma delas), somente o perfil oficial do grupo, na qual todos os membros têm acesso. Além do twitter, eles interagem mais na plataforma “Weverse”, uma rede social coreana criada e desenvolvida pela própria agência a que eles pertencem, a recente Hybe Corporation que também criou sua própria revista em benefício dos artistas. O grupo também conta desde 2015 com um programa de entretenimento na televisão coreana, chamado “Run BTS”, que tem a finalidade de aproximá-los mais dos fãs, pois os mostra como pessoas “normais”, e não o “produto BTS”.

O conjunto de narrativas transmidiáticas a partir do boy group BTS é meramente de exclusividade dos fãs, que, a partir de suas músicas e videoclipes, fazem mutirão nas redes sociais (Twitter) para aumentar as visualizações dos clipes. Elaboram testes no Buzzfeed, realizam covers de suas músicas e coreografias através do YouTube ou da plataforma TikTok para viralizarem as músicas. Também fazem a tradução dos singles para várias línguas, fazem artes, desenhos, pinturas, edições de vídeos e muito mais.

Salienta-se que nem todo fã interage da mesma forma com o produto, porém, a partir do material criado por terceiros, as pessoas consomem e dão audiência. Quem chegou ao fandom há pouco tempo procura vídeos e informações na internet (Google, Youtube) para saber quem são os meninos, seus nomes, traduções de suas músicas, algumas fanfics criadas etc. Essa participação ativa do consumidor é fundamental para o sucesso do boy group.

Essa forma de consumo de entretenimento faz com que os fãs do grupo deixem de ser meros “pró-consumidores”, como diria Jenkins, para assumirem um papel bastante ativo quando se trata de se mobilizar em causas sociais em nome dos ídolos. “Os fãs deixam de ser apenas objetos invisíveis de observação da cultura, para o centro dos estudos sobre o consumo da mídia e cultura”.

“Os efeitos políticos das comunidades de fãs surgem não apenas da produção e circulação de novas ideias (a leitura crítica de textos favoritos), mas também pelo acesso a novas estruturas sociais (inteligência coletiva) e novos modelos de produção cultural (cultura participativa)” (JENKINS, 2006, p. 339).

Em 2020, quando o movimento antirracista Black Lives Matter se intensificou após a morte de George Floyd por um policial branco nos Estados Unidos, o grupo se manifestou contra a discriminação, e até doou uma grande quantia à causa, e seus fãs também promoveram uma ação para ajudar o movimento. Para diminuir o alcance de tweets racistas na hashtag #WhiteLivesMatter (Vidas Brancas Importam), criada por policiais, os Armys começaram a publicar excessivamente vídeos do BTS com a hashtag #BlackLivesMatter (Vidas Pretas Importam), ocultando assim as postagens racistas. O fandom também conseguiu arrecadar e doar cerca de US$1 milhão de dólares para ativistas do movimento.

Outra grande ação foi quando o ex-presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, organizou um comício em Oklahoma para fortalecer sua campanha de reeleição, e apenas 6 mil dos 19 mil eleitores apareceram no evento. O ocorrido se deu porque os fãs do BTS reservaram online a maioria dos ingressos para boicotar o evento.

Os fãs brasileiros também têm muita força. Através das redes sociais, com a hashtag #ARMYHelpThePlanet (Army, ajude o Planeta) o fandom conseguiu arrecadar cerca de 50 mil reais para ajudar o Pantanal nos incêndios de setembro de 2020. O dinheiro foi revertido para o “Instituto Homem Pantaneiro (IHP)”, uma ONG que atua na proteção e conservação do Pantanal sul-mato-grossense.

Uma de suas últimas mobilizações foi este ano, quando os fãs se reuniram para ajudar Manaus em sua crise na saúde –  em muitos hospitais havia falta de equipamentos básicos. Então, uma vaquinha online foi criada com a campanha #ArmyHelpManaus (Army Ajude Manaus), que arrecadou cerca de 58 mil reais. O dinheiro foi revertido para a ONG “Moradia e Cidadania”, do Amazonas, que comprou cilindros de oxigênio para ajudar pacientes da Covid-19.

Em março deste ano, o integrante Min Yoongi, conhecido como Suga, completou mais um ano de vida e os armys aproveitaram para criar o projeto  “Beyond Imagination” (Além da Imaginação), no qual arrecadaram cerca de 13 mil reais. Eles doaram a quantia arrecadada para o Instituto Cuida de Mim, que oferece tratamento para a saúde mental de pessoas carentes. O Instituto utiliza a arte e a cultura para ajudar crianças em condições de vulnerabilidade em São Paulo, com aulas de violão, ballet, percussão e jazz. Essas e outras mobilizações fazem dos Armys, um fandom tão potente quanto seus ídolos. Para Jenkins (2006, p. 82), esse é um processo natural da convergência dos fãs, ao criarem seus próprios pontos de contato.

Conclusão

Sendo assim, é possível ver como essa influência do fandom é tão presente na sociedade atual, graças ao advento da internet que potencializa a interação dos fãs com o grupo e dos fãs entre si. Há diversos grupos no Facebook, fã clubes no Twitter, perfis no Instagram e muito mais. Jenkins, que classificou essa ideia de fandom, deve estar em júbilo, já que todo o seu estudo se concretizou nesse quesito. A forma como consumimos um produto hoje é talvez 10 vezes maior do que antigamente por conta de toda essa nova conjuntura da sociedade.

A transformação cultural é muito evidente quando pensamos na forma como consumimos determinados conteúdos. Não recorremos a mais nenhum jornal ou revista impressa – apenas com um clique, um aplicativo, podemos acompanhar de perto a vida do artista em questão e fazer uma interação direta através das redes sociais, gerando conteúdos e comentários sobre esses artistas, que nos unirá na comunidade de fãs, que resultará em debates, consumo em massa, mobilizações e organização.

__________________________________________

Eduardo Ribeiro é estudante de Jornalismo (Faculdade de Comunicação da UERJ) e estagiário no Lacon.

Beatriz Araújo é estudante de Jornalismo (Faculdade de Comunicação da UERJ).

 

Referências bibliográficas:

DE LIMA, J. O que os fãs de BTS podem ensinar sobre influência nas redes sociais. Sensorial. 28 de jan. 2021. Disponível em: <https://sensorialbr.com/fas-de-bts-e-redes-sociais/> Acesso em: 02 mai. 2021.

ESTEVÃO. BTS lança coleção que homenageia fãs de K-pop em parceria com a Fila. Metrópoles, 22 de jul. 2018. Disponível em: <https://www.google.com.br/amp/s/www.metropoles.com/colunas/ilca-maria-estevao/bts-lanca-colecao-que-homenageia-fas-de-k-pop-em-parceria-com-a-fila%3famp> Acesso em: 02 mai. 2021.

IBE. As 10 marcas mais valiosas do mundo em 2020, segundo a Forbes. IBE Conveniada FGV, 13 de ago. 2020. Disponível em:  <https://www.ibe.edu.br/as-10-marcas-mais-valiosas-do-mundo-em-2020-segundo-a-forbes/ > Acesso em: 02 mai. 2021.

JENKINS , H. Cultura da Convergência.São Paulo: Aleph, 2006.

MARQUETI, G. BTS quebra mais um recorde mundial Guinness com vídeo de “Dynamite”. Nação da Música, 17 de mar. 2021 . Disponível em: <https://br.nacaodamusica.com/posts/bts-guinness-recorde-visualizacoes-dynamite/ > Acesso em: 02 mai. 2021.

MI. BTS – patrocínios, parcerias e contratos milionários. Amino, 4 de nov. 2018. Disponível em: <https://aminoapps.com/c/jeon-jungkook-9507905/page/blog/bts-patrocinios-parcerias-e-contratos-milionarios/gaJn_kvC6uP8Pzv2dlXPP7Q1EJ0wWJV0Yd>Acesso em: 02 mai. 2021.

NUNES, C. BTS: Jungkook faz  marca de chá subir 500% em vendas. Portal Popline. 3 de mar. 2021. Disponível em: <https://portalpopline.com.br/bts-jungkook-faz-marca-de-cha-subir-500-em-vendas/>Acesso em: 02 mai. 2021.

QUEIROGA, L. Fãs do BTS doam R$ 13 mil a instituição que oferece cuidados para a saúde mental, em SP. Extra. 15 de mar. 2021. Disponível em: <https://extra.globo.com/tv-e-lazer/k-pop/fas-do-bts-doam-13-mil-instituicao-que-oferece-cuidados-para-saude-mental-em-sp-24915082.html> Acesso em: 02 mai. 2021.

ROLLING STONE. 21 recordes alcançados pelo BTS. Rolling Stone, 23 de mai. 2019. Disponível em: <https://rollingstone.uol.com.br/noticia/21-recordes-alcancados-pelo-bts/> Acesso em: 02 mai. 2021.

VIOLA, Jojo. A genialidade da ‘marca’ do BTS “As pessoas compram qualquer coisa que eles tocam”. Bangtan Brasil. Disponível em: <https://bangtan.com.br/a-complexidade-da-marca-bts-as-pessoas-compram-qualquer-coisa-que-eles-tocam/> Acesso em: 02 mai. 2021.

O fenômeno sul-coreano BTS