Por: Bruno Silva

Foi publicada nesta quinta-feira a nova edição do Relatório Violência Contra Povos Indígenas no Brasil, o estudo desenvolvido pelo Conselho Indigenista Missionário, o Cimi, que serve como principal parâmetro para medir os índices de violência e reunir relatos de violações contra povos indígenas no país. Publicado desde 1996, o relatório tem acesso livre e gratuito a todos.

O relatório atual, que analisa dados do ano de 2023, revela que 208 indígenas foram assassinados no Brasil, um aumento de 15,5% em relação a 2022. Os estados com o maior número de assassinatos foram Roraima, Mato Grosso do Sul, Amazonas, Rio Grande do Sul e Maranhão. No Maranhão, a violência afetou especialmente a etnia Guajajara residente na Terra Indígena Araribóia; no sul da Bahia, dois jovens Pataxó foram mortos na BR-101. 

Além disso, houve um aumento significativo nos suicídios de indígenas, com 180 casos no ano, um aumento de 56%. O número de casos entre jovens de até 19 anos também subiu 51%, destacando uma preocupação crescente com a saúde mental na população indígena. 

Apesar de uma redução geral nos casos de violência contra povos indígenas, o aumento nos assassinatos não condiz com as promessas do governo atual. O relatório aponta que, o primeiro ano do governo de Luiz Inácio Lula da Silva foi marcado por um lado pela retomada de ações de fiscalização e repressão a invasões. No entanto, foram consideradas insuficientes as iniciativas referentes à demarcação de terras e proteção e assistência às comunidades indígenas. 

No contexto das disputas entre os poderes Legislativo e Judiciário em torno da constitucionalidade da Lei do Marco Civil de Terras Indígenas, o relatório aponta que o ambiente institucional é de continuidade de invasões de terra, conflitos agrários e casos de suicídio entre indígenas.

Destacamos um trecho do relatório, assinado por Luis Ventura Fernández, secretário executivo do Cimi:

"Entre o primeiro e o último momento do ano, o rastro de violência contra os povos indígenas se manteve e, em alguns casos, cresceu. Comunidades indígenas permaneceram assediadas em seus territórios, ameaçadas permanentemente, pulverizadas com agrotóxicos ou despejadas para as beiras de estradas. Os direitos dos povos indígenas acabaram sendo negociados nos bastidores de sempre e foram sacrificados a cada vez que confrontavam grandes empreendimentos"

A questão da demarcação de terras também foi comentada pelo secretário Fernández:

"A demarcação dos territórios indígenas avançou muito pouco, muito aquém do esperado, bem longe do necessário e na contração do urgente. E isto apesar de que os povos indígenas conseguiram, no mês de setembro, uma decisão histórica no âmbito do Supremo Tribunal Federal (STF), que determinou a inconstitucionalidade do marco temporal, facilitando o caminho para a retomada das demarcações"

O Marco Civil e um novo capítulo na disputa por terras indígenas

Em 2023, a violência patrimonial contra povos indígenas no Brasil caiu 4,3%, com a redução nos casos de invasões de terras e danos ao patrimônio. Apesar de uma expectativa de melhorias com a mudança de governo, a realidade continuou a refletir desafios, como a continuidade de invasões e a falta de proteção efetiva aos territórios indígenas.

A questão da terra continua a ser um ponto crítico. Apesar da promessa de demarcar 14 terras indígenas, apenas 10 foram demarcadas até o momento. O relatório também menciona 1.276 casos de violência contra o patrimônio indígena, incluindo invasões e exploração ilegal de recursos naturais.

O conflito em torno do marco temporal, que limita a reivindicação de terras indígenas àquelas ocupadas até 1988, ainda é uma questão controversa. Embora o STF tenha considerado a tese inconstitucional, o Congresso aprovou uma lei que a implementa, evidenciando um descompasso entre os poderes.

O Ministério da Justiça destacou que a Força Nacional de Segurança Pública tem realizado operações para proteger as Terras Indígenas, com apreensões significativas de recursos e animais, e está envolvido na desocupação de vários territórios indígenas. A resposta do Ministério dos Povos Indígenas sobre o relatório ainda não foi recebida.

Esses eventos refletem um cenário em que, apesar de mudanças no governo, as condições para os povos indígenas permanecem desafiadoras, com conflitos contínuos e uma resposta governamental ainda insuficiente.

Coleta de dados

O relatório do Cimi reúne registros de diversas fontes para elaborar seus resultados. Entre eles constam notícias, denúncias de grupos indígenas, os registros das onze entidades regionais do Conselho, além de dados oficiais da Secretaria Especial de Saúde Indígena, do Ministério Público Federal e da Funai, obtidos por meio da Lei de Acesso à Informação. Como os dados oficiais podem ser defasados e não abrangem toda a realidade nacional, há um esforço de análise qualitativa para oferecer uma visão ampla e aprofundada da questão da violência indígena no Brasil.

 

Fonte:

O Globo

Conselho Indigenista Missionário

Assassinatos contra indígenas no Brasil aumentaram 15% em 2023, de acordo com relatório