Este trabalho visa compreender a produção de sentidos sobre o carioca e o Rio de Janeiro em documentários seriados sobre turismo (travel shows ou travel documentary television series) produzidos para a TV por estrangeiros. Por meio de uma análise crítica, o estudo analisa narrativas produzidas em dois momentos históricos distintos: o primeiro, compreendendo os anos de 2007 e 2008, quando a cidade sofria com problemas relacionados à violência com ampla repercussão midiática; e o segundo, em 2012, ano que precede grandes e megaeventos sediados na cidade, e após a implantação das unidades de polícia pacificadora e do início do city branding. A partir desta comparação, é possível perceber que houve uma mudança das narrativas sobre a cidade no que diz respeito ao seu consumo turístico, especialmente em relação à favela, à violência e à pobreza. O local, que antes era excluído ou visto como lugar de perigo extremo e de turismo apenas para poucos e loucos, passa a ser entendido como espaço a ser domesticado, civilizado, principalmente pela presença do poder institucionalizado (Estado) e da sociedade civil com projetos sociais (esportivos) para “ensinar” boas formas de vida. De uma cidade que excluía a favela ou que a apresentava como um lugar de grande risco, as produções passaram, dentre outras questões, a civilizá-la (a favela, no singular, porque, nas representações da mídia internacional, elas são todas iguais, diferenciando-se apenas entre “pacificadas” e “não-pacificadas”, sendo a pacificação uma parte do processo civilizador) para que ela também se tornasse produto a ser consumido, em uma nova geografia do consumo turístico da cidade. Da mesma forma, apresentavam as UPPs como solução para a violência e para o medo na cidade. Pobreza e medo produziam a narrativa da cidade partida (e a “verdade” dos cariocas da “praia”, do “asfalto”, versus os “não-cariocas”, moradores da favela), enquanto o governo do estado tentava, com seu programa de pacificação, “unir” novamente a cidade, levando polícia (“segurança”) e serviços públicos para as áreas mais pobres. Em 2012, os documentários de TV estrangeiros pareceram se unir em torno deste mesmo eixo, defendendo-o como a melhor alternativa para o Rio de Janeiro.  Apesar dessa mudança, certos clichês – tais como o samba, a sensualidade, as praias, a ideia do paraíso idílico – permanecem sólidos não apenas no que diz respeito à representação da cidade, mas na compreensão do Rio como representante de toda uma nação. Estereótipos e clichês produziam sentidos sobre a “cidade perfeita” em consonância com os objetivos do city branding presentes no Plano Aquarela, plano de Marketing Turístico Internacional do Brasil, produzido pela Embratur e pelo Ministério do Turismo. A análise comparativa possibilitou observar que houve uma mudança das narrativas sobre a cidade no que diz respeito ao seu consumo turístico, especialmente em relação à favela, à violência e à pobreza, que passou a ser “consumida” como produto turístico junto aos mais sólidos clichês da cidade: Pão de Açúcar, Cristo Redentor, carnaval, futebol, praia, dentre outros.

Orientado por: Ricardo Ferreira Freitas

Desenvolvido por: Ana Teresa Gotardo

 

Referência:

GOTARDO, Ana Teresa. Rio para gringo: A construção de sentidos sobre o carioca para consumo turístico. 2016. 164 f. Dissertação (Mestrado em Comunicação) – Faculdade de Comunicação Social, Universidade do Estado do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 2016.

Rio para gringo: A construção de sentidos sobre o carioca e a cidade para consumo turístico