Por Érica Fortuna| Outubro/2018

Fonte: Amazon

No livro, a autora trabalha a vida e obra de Walter Benjamin de uma forma leve e carinhosa. O texto tece linhas em que se confundem literatura e importantes construções teórico-metodológicas do filósofo. Já na apresentação, Sarlo (2013) conta como Benjamin e Barthes foram decisivos para a construção do temperamento crítico da autora. Benjamin escrevia cartas para Adorno sobre suas dificuldades financeiras, de sua ex-mulher, filho e ainda sobre a doença de sua irmã. Escrevia, sobretudo, porque tinha a sensação que sua próxima passagem por Paris seria breve. Naquele tempo, as perseguições aos judeus já haviam se iniciado na Alemanha, terra mãe do brilhante filósofo. Quase dois anos depois, em 26 de setembro de 1946, ele se suicidou, tentando atravessar a fronteira franco-espanhola com um visto norte-americano. Seu destino era Nova York, onde esperavam por ele os amigos Gretel e Theodor Adorno. O visto americano de emergência para “refugiados provenientes da Alemanha” foi liberado em negociações com Horkheimer, então diretor nos Estados Unidos do Instituto que se originara em Frankfurt, garantindo a emigração de Benjamin.

Benjamin chegou à fronteira entre a França e a Espanha enfermo e sem seus livros (parte de sua biblioteca havia sido apreendida e parte ficou na Alemanha). As autoridades espanholas fecharam a fronteira e anunciaram que não reconheceriam os vistos de entrada. Precisamente naquele dia, quando chegava exausto ao Port-Bou, Benjamim recebeu a notícia e se matou. A fronteira reabriu no dia seguinte, permitindo a passagem daqueles que o acompanhavam. É possível resistir a acreditar que tudo poderia ser diferente em questão de horas? É possível acreditar que essa história não seja a verdadeira? Muitas especulações giram em torno do falecimento de Walter Benjamin.

Sarlo (2013) detalha a história da vida de Benjamin, mesclando importantes contribuições acadêmicas do autor. A teoria da obra aberta se desenhou também em fatos da vida real. A obra de Benjamin poderia ter se encerrado com um magnífico livro. Entretanto, isso não aconteceu. Muitos escritos foram publicados depois de sua morte e em textos separados, sem um último livro consolidado. Isso deixou algumas de suas considerações abertas a reconstruções, ficando sua obra marcada pela incompletude. No mesmo sentido, Sarlo (2013) ressalta que “a obra é um enigma que, por não ter resolvido em livro, deixa aberto muitos caminhos que o livro teria fechado definitivamente” (SARLO, 2013, p. 33).

Fonte: Panorama

Sobre a metodologia benjaminiana, destaca-se o método poético: o olhar de Benjamin é fragmentário. Ele não exclui a totalidade dos fatos, mas é nela que investiga aspectos aparentemente invisíveis. O incomum que está inserido no comum. “Ele constrói um conhecimento a partir de citações excepcionais, e não só de séries de acontecimentos parecidos” (SARLO, 2013, p. 35). A evidência histórica encontra-se em vínculos longínquos e secretos, mas não imotivados. Dessa forma, elementos históricos são fundamentais para a iluminação de cenários atuais.

Esse conhecimento do futuro naquilo que é velho deriva da capacidade (poética/política) de estabelecer o vínculo que ilumina ambos os termos, violentando sua distância. Trata-se da superposição de duas temporalidades: ‘a verdade histórica se gera na imagem dialética pelo contato entre o agora e sua cognoscibilidade e momentos ou conjunturas específicas do passado (SARLO, 2013, p. 36).

A verdade está nos detalhes e emerge do contraste entre eles. Os objetos mais engessados e comuns são os mais ricos para uma análise atenta. Travestidos de verdades absolutas, escondem sentidos que podem ser catastróficos. “A verdade como uma presa de caça, salta no concreto” (SARLO, 2013, p. 480). São nas bordas, na flexão da história, na materialização dos fatos e do discurso que encontramos as produções de sentidos. E o contraditório, por sua vez, pode sintetizar e explicar os conflitos.

Para Benjamin, nenhuma obra pode ser terminada por completo. Sua escritura trabalha com a intertextualidade, supondo que cada citação pode desdobrar uma série de fissuras, conduzindo a novas ideias e pensamentos. “Como ele gostava de dizer, é encontrar na nova superfície, as linhas da superfície anterior, mas modificadas” (SARLO, 2013, p. 44).

 

Referências

SARLO, Beatriz. Sete ensaios sobre Walter Benjamin e um lampejo. Rio de Janeiro: Editora UFRJ, 2013.

Resenha do livro: Sete ensaios sobre Walter Benjamin e um lampejo – Beatriz Sarlo